Por: Kiyoshi Harada

Interessante decisão foi proferida pelo Juiz da 6ª Vara Cível de Comarca de Santos para condenar o arrematante de imóvel a pagar as despesas condominiais pendentes.

Invocou-se como razão de decidir a obrigação propter rem, isto é, uma obrigação incrustada no direito real que acompanha a propriedade transmitida ao novo titular, correspondendo àquilo que a doutrina denomina de obrigação ambulat cum domino.

Conquanto correta a tese invocada pelo MM. Juiz em termos de direito civil, essa cláusula não se aplica em se tratando de bem adquirido por meio de arrematação em leilão judicial.

A arrematação em hasta pública, a exemplo da usucapião, é forma originária de aquisição. Nenhuma relação jurídica existe com o proprietário anterior.

O arrematante recebe o bem arrematado livre de quaisquer ônus ou obrigações que se sub-rogam no preço da arrematação.
Nesse sentido é a remansosa jurisprudência do STJ:

“Tributário – Arrematação judicial de veículo – Débito de IPVA – Responsabilidade tributária – CTN. art. 130, parágrafo único.
1. A arrematação de bem em hasta pública é considerada como aquisição originária, inexistindo relação jurídica entre o arrematante e o anterior proprietário do bem.
2. Os débitos anteriores à arrematação sub-rogam-se no preço da hasta. Aplicação do artigo 130, parágrafo único, do CTN, em interpretação que se estende aos bens móveis e semoventes.
3. Por falta de prequestionamento, não se pode examinar a alegada violação ao disposto no art. 131, § 2º, da Lei nº 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro).
4. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, não provido” (REsp 807455-RS, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 28-10-2008, DJe 21-11-2008).

“Processual civil e tributário. Execução fiscal. IPTU sobre imóvel arrematado em hasta pública. Exceção de pré-executividade. ilegitimidade passiva. Débitos tributários. Sub-rogação que ocorre sobre o preço. Parágrafo único do art. 130 do CTN. Impossibilidade de imputar-se ao arrematante encargo ou responsabilidade tributária. Obrigação tributária pendente, que persiste perante o fisco, do anterior proprietário.

1. O crédito fiscal perquirido pelo fisco deve ser abatido do pagamento, quando do leilão, por isso que, finda a arrematação, não se pode imputar ao adquirente qualquer encargo ou responsabilidade tributária. Precedentes: (REsp 716438-PR, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 09/12/2008, DJe 17/12/2008; REsp 707.605-SP, Relatora Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ de 22/3/2006; REsp 283.251-AC, Rel. Ministro Humberto Gomes De Barros, Primeira Turma, DJ de 5/11/2001; REsp 166.975-SP, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, DJ de 4/10/1999).

2. Os débitos tributários pendentes sobre o imóvel arrematado, na dicção do art. 130, parágrafo único, do CTN, fazem persistir a obrigação do executado perante o Fisco, posto impossível a transferência do encargo para o arrematante, ante a inexistência de vínculo jurídico com os fatos jurídicos tributários específicos, ou com o sujeito tributário. Nesse sentido: ‘Se o preço alcançado na arrematação em hasta pública não for suficiente para cobrir o débito tributário, nem por isso o arrematante fica responsável pelo eventual saldo’ (Bernardo Ribeiro de Moraes, Compêndio de Direito Tributário, 2º vol., Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 513).

3. A regência normativa em tela é a do CTN, parágrafo único, do art. 130, dispositivo especial quanto ao caput, posto ser este aplicado nas relações obrigacionais de transferência de domínio ou posse de imóvel. In casu, a situação é especialíssima e adversa, não havendo que se falar em transferência de domínio por fins de aquisição dentro relações obrigacionais civis, seja de compra e venda, cessão, doação etc.

4. Deveras, revela-se inadequado imprimir à questão contornos obrigacionais, sendo impróprio aduzir-se a alienante e adquirente, mas sim em executado e arrematante, respectivamente, diante da inexistência de vínculo jurídico com os fatos jurídicos tributários específicos, ou com o sujeito tributário. O executado, antigo proprietário, tem relação jurídico-tributária com o Fisco, e o arrematante tem relação jurídica com o Estado-juiz.

5. Assim, é que a arrematação em hasta pública tem o efeito de expurgar qualquer ônus obrigacional sobre o imóvel para o arrematante, transferindo-o livremente de qualquer encargo ou responsabilidade tributária.

6. Recurso especial desprovido” (REsp 1059102/RS, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 3-9-2009, DJe 7-10-2009).

“Execução fiscal – IPTU – Arrematação de bem imóvel – Aquisição originária – Inexistência de responsabilidade tributária do arrematante – Aplicação do art. 130, parágrafo único, do CTN.

1. A arrematação de bem móvel ou imóvel em hasta pública é considerada como aquisição originária, inexistindo relação jurídica entre o arrematante e o anterior proprietário do bem, de maneira que os débitos tributários anteriores à arrematação sub-rogam-se no preço da hasta.

2. Agravo regimental não provido” (AgRg no Ag 1225813-SP, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 23-3-2010, DJe 8-4-2010).

No caso sob exame cabe ao Condomínio ressarcir-se das despesas condominiais a que tem direito, recebendo o valor respectivo por conta do preço depositado na arrematação.

SP, 21-5-2021.